Já plantei muitas árvores.
Também já tenho uma filha.
Faltava apenas escrever um livro.
Entre o item das árvores, ou talvez até antes dele, já alimentava este desejo de escrever. Escrever a sério. O exercício começou com o primeiro diário que a Mãe me ofereceu. Desenvolveu-se nas composições da escola onde, quase sempre, era a melhor da turma e, portanto, era obrigada a ir de sala em sala a ler aos outros meninos as palavras que escrevia.
Na faculdade troquei muitas cartas com uma colega-melhor amiga. Propositadamente. Combinámos escrever sempre uma à outra aquilo que os olhos-nos-olhos por vezes não permitiam. Por medo, falta de tempo, sei lá... As minhas interrogações passaram a ter um destinatário que já não era apenas um dos muitos diários que passei a coleccionar ao longo dos anos.
Depois veio o jornalismo e, com ele, uma nova escrita. Sem grande margem para dúvidas pessoais. Escrita isenta e objectiva. É o que se pede. Mas nunca concordei muito com isto. O relato de algo também tem sempre um bocadinho de nós na medida em que quem informa escolhe um ângulo de abordagem. Dois jornalistas não escreveriam da mesma forma um mesmo acontecimento. No entanto, ambas as notícias seriam válidas.
Cultivei a minha escrita. Sempre feita a olhar os outros. A inventar histórias possíveis de rostos anónimos que se cruzaram por mim. Um velho na rua com um gato, uma prostituta cabo-verdiana, pessoas-tipo que construí baseada em muita gente que se fundiu numa só. Gosto de escrever contos. Não sou de grandes palavras. Defeito profissional talvez... Mas prefiro pensar numa escrita depurada, sem floreados, directa ao íntimo de cada um, sem grandes rodeios ou alaridos para tocar os outros.
Poucas pessoas me leram. Não gosto muito de mostrar este lado de mim. Não é segredo mas é tão íntimo como algo inconfessável. E depois sempre achei que ainda era demasiado imatura para escrever a sério.
Até um dia.
Não faz muito tempo que a vontade, quase urgente, de escrever a sério veio à tona. E de um pequeno conto começou a nascer uma história. Não sei se grande história, isto é, se as pessoas vão gostar, se alguma vez irá ter estatuto de best-seller. Grande porque, pela primeira vez, me atrevi a alargar as fronteiras do conto e de mergulhar no texto. Ficção. Ou não...
A verdade é que achei que nunca seria capaz. Que nunca conseguiria fazer nascer uma história, deixar que as personagens nascessem na minha cabeça, que se entranhassem em mim e que me ditassem o rumo que queriam seguir. Sempre foi uma coisa que me fez muita confusão: como é que os escritores encontram tanto assunto, tantas histórias que acabam em livro?
Mas desta vez quis tentar. Arrisquei. Escrevi e parei. Deixei-me estar quieta duas semanas. E, de mansinho, a história veio até mim. Mais do que olhar para as coisas, para as pessoas, tentei ver. E sem saber bem como, o mundo mudou.
Corri para o computador e escrevi compulsivamente. Até à madrugada de ontem. Não sei quanto tempo estive neste estado de "transe". Só sei que escrevi, escrevi, escrevi e não tive sono, nem fome, nem cansaço. Foi como se estas personagens fizessem de mim marioneta e não descansaram até sairem cá para fora.
Sem saber como comecei e, nem tão pouco, como acabei, escrevi uma história. Grande.
Hoje finalmente percebi que as palavras criam caminhos. Nós só temos de os seguir...
2 comentários:
Depois quero ler o manuscrito!!! :)
Uau!
Como te entendo!
Parece que em certos momentos, as palavras não se esgotam e vão jorrando, umas atrás das outras!
Espero que depois nos digas, quando terminares o livro, Mammy!
Deve estar 100000000000 estrelas!
:)
Bjs!
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